terça-feira, 11 de março de 2014

Surpresas Linguísticas

Liguei pra casa. A babá atendeu, nos falamos. "A Clarinha está aqui, quer falar com você". "Oi, filha!". "Oi". Falou mais distante, contando para a babá: "É a minha mamãe!".

A "minha mamãe". Também sou "mamãe Ana". Consciente de que todo mundo no mundo tem mãe ou já teve um dia, mas essa é a mamãe dela, e especificamente a mamãe Ana.

É incrível quando seu filho, formerly known as "o feijão", começa a falar. Qualquer coisa já é o máximo. Qualquer coisa que ele nem sabe o que é já é o máximo. Aos dois meses Clara vocalizou "mamã". Eu sei que ela não estava dizendo nada, mas foi logo depois do pai pedir, aos choramingos, "fala papai, fala? Fala papai". A resposta, demonstração das ironias dessa vida, virou episódio muito repetido. Se eu achei o máximo uma vocalização, imagine essa coisa cognitiva, cheia de sentido e intenção, "a minha mamãe". A mãe derrete.

As surpresas vão se esticando. Um dia você percebe que o "mamã" não é mais acidente, é pra você - com todo o jeito de "vem aqui, carambola, que eu estou com pressa!". Vai se desdobrando. Mamãe. Papai. Cacá. "E quem é Cacá?", leva o dedo ao próprio peito e dá um sorriso. E eu que achei que ela nunca teria um apelido, como eu nunca tive, e cheguei a ficar até um pouquinho tristinha por causa disso - todo mundo que é querido e popular tem apelido. Não ter apelido já é o primeiro sinal de que a popularidade está longe. Não ligo para Clara ser popular, mas gostaria que ela fosse querida, como de fato é. E olha como o destino é cheio de peças, não só ela tem um apelido, como foi ela mesma quem escolheu - e pegou. A nossa Cacá.

O cachorro, o outro cachorro, a água. Uma novidade: "por favor". Outra novidade, "obrigada". Começou a dizer "de nada" quando trazia as coisas para alguém, mesmo se a pessoa não se importasse a agradecer - fica a dica, né? Eu trouxe, você deveria agradecer, então "de nada". Esses dias eu pedi que ela bebesse o iogurte, antes de começar a comer a banana. Deu uma bicada. "Só isso não, o iogurte todo, filha". Primeiro ela disse "ê, nóis!", depois bebeu. Impressão minha ou ela me disse "eita, nóis!"? Coisa que eu costumo dizer quando a coisa está meio difícil, meio enroscada. Acho que ela me disse "eita, nóis!".

Atender o telefone. A melhor surpresa de todas, "eu te amo". Suas adoráveis variações, "te aminho" e "te amão". Vem com abraço e beijo, como somos lambonas. Quando estamos saindo, "espera, também vou!". Quando estamos indo embora, "um beijo, papai, um beijo! Tchau, te amo". Quando repreendemos, "hum..." - com biquinho. Quando faço perguntas "ahn?" - olhos arregalados. Quanto não sabe, "não sabo". "Não consegue". "Ajuda, mamãe, ajuuuuudaaaaa!". Quando eu pergunto porque, levanta os ombrinhos ou as mãozinhas, desolada "putê, putê...".

Eu sempre gostei das palavras. De todas elas, em todos os seus contextos, ditas ou escritas ou até pensadas. E aí veio essa aranhinha. Essa aranhinha com todas as suas flexíveis patinhas, e a sua teia. Essa teia doce e gigante, que eu percebo que não vai parar de crescer e me aprisionar cada vez mais. Mas a teia é uma teia de palavras e de sentimentos, de abraços e beijos, de descoberta e de perplexidade. Ela é um pouquinho teimosa, mas nem chega a ser desobediente. Minha dona aranha continua é a tecer.

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